A Evolução do EMDR – parte 3

21 de março de 2015

Continuação da Entrevista Dra. Francine Shapiro – Parte 3

Movimento Ocular

RW – Após a fase da preparação, geralmente introduzo o componente do movimento ocular. Primeiro eu sigo o protocolo, a imagem alvo. Muitas pessoas não querem que ela seja uma memória – eles buscam a terapia com uma ansiedade com a qual estão lidando no momento e não necessariamente fazem a conexão com as memórias. Então eu poderia começar com uma imagem alvo como:¨Quando o rosto de meu marido fica bravo e carrancudo, eu entro em pânico ¨. Em seguida eu tomo nota das auto-crenças negativas e avalio o nível de ansiedade em uma escala de intensidade que varia de 0 a 10. Eu vejo onde a ansiedade é sentida no corpo. Enquanto eles seguem esses passos do protocolo, eles identificam o que estão sentindo, quais são suas crenças: ¨Eu sou uma pessoa má. Eu serei um fracasso. Eu serei humilhada. Eu serei punida¨.

Então  eu traço uma linha no meio do tablet e pergunto: ¨Quais crenças você gostaria de ter ?¨ Isso sai diretamente do seu protocolo.  Esse procedimento frequentemente surpreende as pessoas, mas quando elas entendem o objetivo, podem facilmente elaborar¨. Eu gostaria de ter confiança de que posso lidar com este momento¨. ¨Eu gostaria de ter certeza que posso ficar calmo e ser razoável ¨ – esse tipo de coisa.

É um momento poderoso quando coloco minha cadeira diante do paciente e levanto minha mão. A rapidez do movimento de um lado para o outro, a amplitude do movimento – que dependem de cada pessoa, e então eles visualizam aquela imagem – elas estão vendo a face do marido, ficando cada vez mais bravo, e elas podem realmente sentir suas crenças, ¨Eu estou pronta para ser destruída. É fenomenal. É muito diferente¨.

F –  Já ficou demonstrado, em aproximadamente 16 estudos randomizados, que o movimento ocular também modificar rapidamente a nitidez da memória, bem como diminuir a emoção. Então os pacientes podem começar com uma perturbação, mas ela se reduz muito rapidamente e muda para esse novo entendimento – de ¨era assim que meu pai olhava para mim¨  para ¨não estava certo ele fazer isso¨, de ¨não foi minha culpa¨ para ¨foi culpa dele¨.  É como estar sendo liberado de como elas se sentiam quando crianças, de forma que elas possam ver o presente de maneira mais clara.

RW – Isto é a mais pura verdade.

F – É claro que pode ser necessária uma terapia de casal, mas em muitos casos, essas reações exageradas são causadas por eventos da primeira infância, armazenados como memórias não processadas.

RW – Nós todos sabemos que quando nosso sistema nervoso simpático é estimulado, o a clareza de pensamento sai pela janela.

F- Correto, exatamente.

RW – A questão nesse caso é que quando você está fazendo a parte do movimento ocular, depois de ter feito a preparação auto tranquilizadora e os componentes cognitivos das crenças e das crenças desejadas, a mudança é tão visível.  A pessoa pode ter quatro ou cinco associações: ¨Eu vejo meus pais brigando. Eu me vejo escondida atrás da porta. Eu me sinto apavorada. Eu sinto que deveria impedir a briga deles. A culpa é minha.¨ O terapeuta escolhe então uma dessas memórias, creio que depende da perícia do terapeuta saber qual escolher, para levar a uma nova série de associações. Mas quando o terapeuta é muito receptivo – sem julgar, sem demonstrar ansiedade – essa tranquilidade é sempre recompensada.  Depois da próxima série de repetições, a pessoa diz, ¨Eu não tenho que resgatar ninguém. A culpa não é minha¨. Eles vão dizer isso. O terapeuta nunca tem que dizer isso. Os pacientes chegam a essa conclusão por conta própria.

F – Frequentemente o terapeuta pode manter-se totalmente fora do processo, incentivar e apoiar o paciente de forma não verbal. Nós estamos transmitindo a aceitação porque nós a aceitamos. Estamos transmitindo respeito incondicional porque é parte do processo terapêutico. Assim, os pacientes não precisam ter medo de suas próprias emoções. Eles não precisam ter medo e podem revelar o que tiverem vontade. Em outras formas de terapia, você tem que descrever as memórias nos mínimos detalhes. Com a terapia de EMDR, isso não é necessário. O paciente diz o quanto quiser, seja muito ou pouco.  Na verdade, em muitos casos, você pode empregar a técnica sem qualquer conteúdo, e o paciente apenas lhe dá informações suficientes para saber que houve alguma mudança. Assim, vítimas de estupro ou de abuso sexual, que podem sentir tanta vergonha e culpa a ponto de não querer falar sobre o evento em um primeiro momento – não precisam de fazê-lo. Você não precisa forçar o paciente a fazer ou a dizer qualquer coisa que não queira.

RW – A questão sobre a calma, a aceitação e o respeito incondicional é um componente que você destaca em seus treinamentos, mas eu não sei como ela é vista por algumas pessoas que pensam que o EMDR é simplesmente uma técnica.

F- Existem procedimentos específicos sobre quando continuar as associações e quando retornar para o alvo, mas a beleza do processo é permitir que o mecanismo interno intrínseco de cura tome conta e faça as associações adequadas e que o terapeuta não assuma uma atitude de saber mais do que o paciente, que você é aquele que tem que dar as respostas. Na maioria dos casos, as conexões estão todas lá para o cliente, e quando elas não estiverem, nós temos procedimentos específicos da terapia de EMDR para reiniciá-las. Não se trata de terapeutas se impondo para os pacientes, mas, sim, permitindo que a cura apropriada ocorra.

RW – Então qual é o próximo estágio?

F. A Avaliação é a terceira fase, na qual você está identificando a memória e seus diferentes componentes. Depois você move-se para uma fase que chamamos de Dessensibilização, que consiste em permitir que os insights e conexões sejam feitos até que atinjam o zero na escala SUDS (Escala de Unidades Subjetivas de Perturbação). Pode ser que ela tenha começado com um 8 ou 9 de perturbação, mas desceu a zero.

Depois nos movemos para uma fase que denominamos Instalação, que tem a ver com concentrar-se na crença positiva desejada pelo paciente e ver se podemos fortalecê-la, para que seja percebida pelo paciente como completamente verdadeira.

Então vamos para a fase do Escaneamento Corporal, na qual fazemos com que a pessoa pense naquela memória, pense na crença positiva e escaneie o corpo para ver se há qualquer perturbação; e se houver, nós a processamos. Por exemplo, uma vítima de abuso que esteja se sentindo bem e poderosa escaneia o corpo e observa que há uma estranha sensação nas costas, e nós focamos naquilo. No final das contas, descobre-se que foi a parte do corpo onde ela foi agarrada e imobilizada durante o estupro. Aí nós processamos isso.

No final da sessão, a fase de Fechamento traz o paciente de volta ao estado pleno de equilíbrio. Nós os lembramos das técnicas de auto-controle e o processamento no período entre sessões que eles mesmos podem continuar a fazer. Nós também sugerimos que, se uma perturbação surgir, eles  apenas anotem brevemente o que aconteceu – Eu deparei-me com tal situação e algo foi disparado em mim – para que ela seja o alvo na próxima vez.

Assim, a oitava fase na próxima sessão é a Reavaliação, quando trazemos de volta a memória e vemos como o paciente se sente. Vemos se há algo mais a ser abordado. Por exemplo, eu trabalhei com uma menina que havia sido molestada pelo seu avô, e no final da sessão ela estava dizendo: Ele era de realmente fraco. Eu corri para o banheiro e ele tentou entrar. Eu ficava dizendo para ele ir embora, e ele foi embora.

Na sessão seguinte, quando eu a vi, ela sentia-se bem. Ela não se sentia suja. Ela não sentia vergonha. Ela não se sentia impotente. Ela tinha as coisas sobre controle.  Mas quando a perguntei o que mais estava por acontecer, ela disse: ‘Bem, eu estava pensando sobre a minha avó, que não acreditou em mim quando eu disse que fui molestada’. Então, esse é um novo alvo.  Nós identificamos o que mais precisa ser processado, e é assim que a terapia continua.

Nós processamos a memória, avaliamos, reavaliamos e vemos o que mais precisa ser feito até que basicamente tenhamos abordado todas as questões, e o paciente se sinta fortalecido. Não se trata apenas do desaparecimento dos principais sintomas, mas eles se sentem como um ser humano positivo, saudável e com recursos e que agora estão aptos a estabelecer e manter relacionamentos positivos em suas vidas.

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