O Açúcar e seu Cérebro

26 de junho de 2015

A função cognitiva pode ser afetada por dieta rica em doces, concluem pesquisadores americanos em artigo publicado na revista Neuroscience traduzida pela equipe do Espaço da Mente.

Gordura e açúcar causam mudanças nas populações de bactérias que podem se relacionar a perda de flexibilidade da função cognitiva

Um estudo feito na Oregon State University indica que uma dieta com elevados níveis de gordura e açúcar, comparada a uma dieta normal, causa mudanças na composição das bactérias que vivem no intestino e isso parece se correlacionar a perda significativa de “flexibilidade cognitiva”, ou o poder de adaptar e ajustar a situações em mudança.

Esse efeito foi mais sério em uma dieta com níveis elevados de açúcar, que também mostrou prejuízos em aprendizagem precoce tanto em memórias de curto quanto de longo prazos.

Os achados são consistentes com alguns outros estudos sobre o impacto de gordura e açúcar na função cognitiva e comportamento, e sugere que alguns desses problemas podem ser vinculados a alterações do microbioma – uma mistura complexa no sistema digestivo, composto por aproximadamente 100 trilhões de micro-organismos.

A pesquisa foi feita com ratos de laboratório que foram submetidos a dietas diferentes e depois tinham que enfrentar uma variedade de testes, tais como o teste do labirinto com água, para monitorar mudanças em suas funções mentais e físicas, e impactos associados a vários tipos de bactéria. As descobertas foram publicadas no periódico Neuroscience, em um trabalho apoiado pela Microbiology Foundation e a National Science Foundation.

“Tem ficado cada vez mais claro que as bactérias que vivem em nossos intestinos, ou microbiota, podem se comunicar com o cérebro humano,” esclarece Kathy Magnusson, uma professora no OSU College of Veterinary Medicine, e investigadora principal no Linus Pauling Institute.

“Bactérias podem liberar compostos que agem como neurotransmissores, estimular nervos sensitivos do sistema imunológico e afetar um espectro amplo de funções biológicas”, ela afirmou. “Não estamos seguros de exatamente quais mensagens são enviadas, mas estamos localizando os trajetos e os efeitos”.

Tem sido provado que ratos oferecem um modelo particularmente bom para estudos relevantes aos humanos, afirma Magnusson, em especial em relação a certos tópicos, tais como: envelhecimento, memória espacial, obesidade e outros temas.

Nessa pesquisa, depois de somente quatro semanas com uma dieta hipercalórica – altos níveis de gordura e açúcar, a performance de ratos em vários testes de função mental e física começou a cair, comparada com o desempenho de animais em uma dieta normal. Uma das mudanças mais marcantes foi no que os pesquisadores chamaram de flexibilidade cognitiva.

“O bloqueio da flexibilidade cognitiva neste estudo foi bastante forte”, comenta Magnusson. “Pense em dirigir para casa seguindo uma rota com a qual você está bastante familiarizado, algo que você está acostumado a fazer. Repentinamente um belo dia essa rua está fechada para reparos você tem que encontrar um novo caminho para casa”.

Uma pessoa com níveis elevados de flexibilidade cognitiva iria adaptar-se imediatamente à mudança, determinar a segunda melhor rota para casa e lembrar-se de usar o mesmo trajeto no dia seguinte, tudo isso com poucos problemas. Para a pessoa com comprometimento dessa flexibilidade, pode ser um caminho longo, lento e estressante de volta para casa.

Este estudo foi feito com animais jovens, confirma Magnusson, que supostamente teriam um sistema biológico mais saudável, mais capaz de resistir às influências patológicas de sua microbiota. Os achados podem ser ainda mais pronunciados com animais mais velhos ou com humanos que tenham o sistema intestinal comprometido, ela conclui.

O que usualmente denominado como a “dieta do Ocidente”, ou seja: comidas com teores elevados de açúcares, gordura e carboidratos simples, já foi ligada a uma série de doenças crônicas nos Estados Unidos, incluindo a epidemia de obesidade e a incidência elevada de doença de Alzheimer.

“Já sabemos há algum tempo que gordura e açúcar em excesso faz mal para sua saúde”, afirma Magnusson. “Este trabalho sugere que gordura e açúcar estão alterando seu sistema bacteriano saudável e essa é uma das razões pelas quais essas comidas não são boas para você. Não é somente a comida que pode influenciar o funcionamento de seu cérebro, mas mais especificamente a interação entre comida e as mudanças microbianas.”

Esse tema da flora/fauna intestinal começa a ganhar mais espaço na psiconeuroimunologia, com publicações crescentes que alertam para a importância de monitorar nosso estilo de vida alimentar e os impactos não só físicos, mas também emocionais dessas escolhas alimentares.

Referência Bibliográfica:
K.R. Magnusson, L. Hauck, B.M. Jeffrey, V. Elias, A. Humphrey, R. Nath, A. Perrone, L.E. Bermudez. Relationships between diet-related changes in the gut microbiome and cognitive flexibility. Neuroscience, 2015; 300: 128 DOI: 10.1016/j.neuroscience.2015.05.016

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